O sinal fechou e eu, a contra gosto, parei. [Estava atrasada...]
29 de nov. de 2011
Qual é o sinal?
O sinal fechou e eu, a contra gosto, parei. [Estava atrasada...]
24 de nov. de 2011
Estamos vivendo um paradoxo.
Nunca se ouviu tanto falar em solidão e recolhimento – pretensamente com o subtítulo de prática para o crescimento espiritual. Evidente que a evolução deve ser buscada e oferece elevação para o espírito daquele que a busca. Essa procura é mesmo solitária, e a isto chamamos solitude. Trata-se de outra coisa, para a qual te convido a acompanhar-me nesta reflexão.
Eu estava parada num cruzamento movimentado do centro da cidade, esperando abrir o farol. Não pude me furtar a observar o ritmo frenético das pessoas que passavam, e mais do que passos apressados, observei-lhes as faces, os ombros, a postura do corpo projetado pra frente, como escudo a um obstáculo invisível. Os motoristas compondo uma dança de avança_sinal_atropela_transeuntes, numa pressa justificada pelo relógio que marca sempre a hora acelerada de dias intermináveis. Sondei o incômodo que senti diante dessa coisa grotesca que chamamos hora do rush.
Que resistência é essa que tornamos clara no corpo?
Que peso é esse que sobrecarrega nossos ombros?
Que tensão é essa que se dobra nas rugas dos rostos jovens, nas marcas claras de um disfarçado aborrecimento, da insatisfação?
Onde fica o que tanto buscamos?
E pra onde essa gente vai com tamanha sofreguidão?
Que vida caricata é essa que levamos? – me perguntei.
E passei a correlacionar esse aspecto com outro: não há precedentes de tanta exposição emocional nas redes sociais – nunca foi declarada a solidão das pessoas como agora, pedidos claros de afeição, de atenção. Misteriosamente, essas pessoas que desejam ser ouvidas, que sonham com uma atenção especial, cada vez mais se refugiam na virtualidade das relações. Será que ali encontram um conforto que acomoda as sensações de abandono, de exclusão, de não pertencimento? Talvez possam ser o que são, ou não precisem dar tantas explicações, recebam melhor aceitação, menos críticas, mais...o que?
Essa modalidade pretere as relações em que nos permite conversar com os olhos nos olhos de nosso interlocutor, onde um abraço toca o corpo e a alma, quando é possível secar o pranto de um amigo, consolar uma dor com o afago de mãos carinhosas. Estar diante de pessoas é mais do que colocar nossos ouvidos à disposição, é estar em prontidão para uma troca afetiva que envolve a presença, em que um olhar confirma um mínimo gesto em direção ao outro, quando o beijo pode ser cúmplice daquele amor, quando a atenção e o carinho podem fazer a diferença. Onde foi parar esta nossa preferência de conviver em sociedade? Como o partilhar de nossas existências pôde ser reduzido ao clique de um botão?
Também isto apareceu nesta conjuntura reflexiva. Em uma casa de chá assisti a uma cena triste: um casal jovem, ela grávida. Ao que parece, foram buscar uma encomenda, e, enquanto aguardavam, tomaram um café. Ela se dirigiu ao balcão, depois à mesa, e ele sempre ao seu lado...manuseando sofregamente seu iPed. Ela falava e ele respondia sem olhar. Ela escolheu o salgado para os dois enquanto ele se contentava com a tela à sua frente. - Em que ambiente essa criança vai viver? – pensei. Bem, terá sua mãe, então com sorte não precisaria sair da maternidade com um eletroeletrônico para si, junto das fraldas...
Mas não precisei sair às ruas para ver o absurdo em que caímos. Em um almoço familiar as crianças e jovens participam com as cabeças baixas, dedos ágeis nos seus joguinhos de ultima geração. Assustam-me as conversas que não terei com meus netos, caso façamos de seus mundos essa alienação repleta de um vazio ensurdecedor...
Você acha que é só esta a questão?
Outro aspecto merece que prestemos urgente atenção. Quer ver?
Se observarmos mais profundamente, quem é que para pra ouvir aquele conhecido e automatizado: - oi, tudo bem? - quando cruza com alguém? Até mesmo ao encontrarmos com alguém, para o mesmo cumprimento, a resposta sequer acompanha o olhar, que já está perdido lá na frente da próxima obrigação. Experimentei surpreender na resposta, e precisei conter o riso ante o menear rápido de uma cabeça e lábios entreabertos de surpresa diante de meu “não, não estou bem.”
Isso mostra a hipnose coletiva que vivemos? Por isso as queixas são parecidas, então...
Ouvimos falar da privacidade e da individualidade – direitos legítimos que defendo como essenciais à nossa formação. Mas...quando foi que nos tornamos individualistas e perdemos o interesse pelas pessoas que nos cercam? – as mesmas que acusamos de abandono, que, retribuindo na mesma moeda, contribuímos para afastar mais e mais, segregando-nos e ao outro, como ilhas a namorar o mar que as rodeia.
Substituímos por valores mais fortes e consistentes aqueles que cresceram enraizados nas nossas entranhas? O que foi feito das reuniões familiares que rendiam aos domingos os melhores momentos ao reunirem as pessoas que planejavam antecipadamente o cardápio, escolhiam músicas, doces, e contavam longas histórias numa roda de intermináveis conversas cheias de risadas e crianças andando de bicicleta e correndo à volta? Elas eram barulhentas, mas enchiam de vida a vida dos adultos que, por sua vez, as levavam ao parque enquanto conversavam com outros pais, tomavam decisões importantes em conversas que eram retomadas – hoje as coisas são decididas pra ontem, ponderadas rapidamente, espremidas nos carros enquanto seguem para seus trabalhos, muitas vezes absortos no trânsito, ou, como eu que, ali em companhia de minhas músicas preferidas, mergulhada no trânsito caótico de uma cidade inchada de carros, divagava com o olhar perdido em algum lugar dentro de mim mesma...
Muito pessimismo meu, você está achando? Em qual parte deste texto você já se enxergou? Em qual ponto da leitura tua inquietação começou? Qual sentimento minha reflexão despertou aí dentro de você?
Ah, tua indignação é porque você faz parte daqueles que se enquadram na descrição dos almoços em família? Você [ainda] se reúne com os avós, os tios, jogam cartas, discutem política, mostram os artesanatos que fizeram, trocam receitas, discutem as novelas e seus excessos, fazem passeios, cantam, dançam e viajam juntos. Você também foi ao parque neste fim de semana!!! Sim, existe tudo isso e é maravilhoso, e não estou aqui dizendo que somos a minoria. Ou somos?
Talvez esteja estranhando, se perguntando onde está aquela mulher que demonstra tanto otimismo e fé na natureza humana. Claro que não pintei um retrato sem solução ou sem alma, menos ainda estou fazendo apologia à solidão humana – mas, justamente por preocupar-me com o ser humano, ser aquela que crê na felicidade e defensora de suas infinitas possibilidades de realização, penso que se a gente não tomar cuidado, não prestar atenção - não despertar - poderá entrar nessa barganha infeliz de trocar a vida pela plastificação dos sentimentos, pela destonalização das emoções, e não há remédio que combata esse mal, não conheço efeito mais triste, devasta_dor, do que aquele que consiga afetar nossa alegria de viver. Você conhece?