“Planto flores no caminho para que não me faltem as

borboletas. Foram elas que me ensinaram que o casulo

não é o fim. É o começo."

Day Anne



11 de abr. de 2008

"Longe é um lugar que não existe."


Rae Hansen, uma menininha às vésperas de comemorar seus cinco anos, convida Richard Bach para sua festa de aniversário. Mesmo sabendo que sua casa ficava muito distante, para além dos mares, o aguarda, confiante.

"Rae! Obrigado por me convidar para a sua festa de aniversário!"

Sua casa fica a mil quilômetros da minha e viajo apenas pela melhor das razões. E uma festa para Rae é a melhor e estou ansioso para estar ao seu lado.
Começo a viagem no coração do Beija-Flor, que há tanto tempo você e eu conhecemos. Ele se mostrou amigo como sempre, mas ficou espantado quando lhe disse que a pequena Rae estava crescendo e que eu estava indo à sua festa de aniversário, levando um presente.
Voamos algum tempo em silêncio, até que finalmente ele disse:
- Não entendo muito bem o que você falou, mas o que menos entendo é o fato de estar "indo" a uma festa.
- Claro que estou indo à festa. - respondi. - O que há de tão difícil de se compreender nisso?

Ele ficou calado e só voltou a falar quando chegamos à casa da coruja:
- Podem os quilômetros separar-nos realmente dos amigos? Se quer estar com Rae, já não está lá?
- A pequena Rae está crescendo e estou indo à sua festa de aniversário com um presente. - falei para a coruja.
Parecia estranho dizer "indo" depois da conversa com Beija-Flor, mas falei assim mesmo para que Coruja compreendesse.
Ela voou em silêncio pôr um longo tempo.
Era um silêncio amistoso, mas Coruja disse ao me deixar em segurança na casa da águia:
- Não entendo muito bem o que você falou, mas o que menos entendo é ter chamado sua amiga de "pequena".
- Claro que ela é pequena, porque não é crescida - respondi. - O que há de tão difícil de se compreender nisso?
Coruja fitou-me com os olhos profundos, cor de âmbar, sorriu e disse:
- Pense a respeito.

- A pequena Rae está crescendo e estou indo à sua festa de aniversário com um presente. - falei para Águia.
Parecia estranho falar agora "indo" e "pequena", depois das conversas com Beija-Flor e Coruja, mas falei assim mesmo para que Águia compreendesse.
Voamos juntos sobre as montanhas, subindo nos ventos das montanhas.E Águia finalmente disse :
- Não entendo muito bem o que você falou, mas o que menos entendo é essa palavra "aniversário".
- Claro que é aniversário. - respondi. - Vamos comemorar a hora que Rae começou e antes da qual ela não era. O que há de tão difícil de se compreender nisso?

Águia curvou as asas para a descida e foi pousar suavemente sobre a areia do deserto.
- Um tempo antes de Rae começar? Não acha que é mais a vida de Rae que começou antes que o tempo existisse?
- A pequena Rae está crescendo e estou indo à sua festa de aniversário com um presente. - falei para Gavião.
Parecia estranho falar "indo", "pequena" e "aniversário", depois das conversas com Beija-Flor, Coruja e Águia, mas falei assim mesmo para que Gavião compreendesse.
O deserto se estendia interminavelmente lá embaixo e ele finalmente disse:
- Não entendo muito bem o que você falou, mas o que menos entendo é "crescendo".
- Claro que ela está crescendo - respondi. - Rae está mais perto de ser adulta, mais longe de ser criança. O que há de tão difícil de se compreender nisso?

Gavião pousou finalmente numa praia deserta.
- Mais um ano longe de ser criança? Isso não me parece ser o mesmo que crescer.
E Gavião alçou vôo e foi embora.

Eu conhecia o bom senso de Gaivota. Voamos juntos, pensei com muito cuidado e escolhi as palavras, a fim de que, ao falar, Gaivota soubesse que eu estava aprendendo:
- Gaivota, por que está me levando a voar para ver Rae, quando na verdade sabe que estou com ela?
Gaivota sobrevoou o mar, as colinas, as ruas e pousou suavemente em seu telhado e disse:
- Porque o importante é você saber a verdade. Até saber, até realmente compreender, só pode demonstrá-la em coisas menores, com ajuda externa, de máquinas e pessoas e pássaros. Mas deve se lembrar sempre que não saber não impede a verdade de ser verdadeira.
E Gaivota se foi.

E agora é chegado o momento de abrir o seu presente. Presentes de lata e vidro amassam e quebram num dia, somem para sempre. Mas eu tenho um presente melhor para você.

É um anel para você usar.
Cintila com uma luz especial e não pode ser tirado por ninguém, não pode ser destruído. Somente você, no mundo inteiro, pode ver o anel que lhe dou hoje, como fui o único que pude vê-lo quando era meu.
O anel lhe dá um novo poder. Usando-o, você pode alçar vôo nas asas de todos os pássaros que voam.
Pode ver através dos olhos dourados deles, pode tocar o vento que passa pôr suas penas macias, pode conhecer a alegria de se elevar muito acima do mundo e suas preocupações.
Pode permanecer no céu pôr tanto tempo quanto quiser, através da noite, pelo descer do sol; e quando sentir vontade de outra vez descer, suas perguntas terão respostas, suas preocupações terão acabado.
Como tudo o que não pode ser tocado com a mão nem visto com o olho, seu presente se torna mais forte à medida que o usa.
A princípio, pode usá-lo apenas quando está fora de casa, contemplando o pássaro com quem você voa.
Mais tarde, porém, se usá-lo bem, vai funcionar com pássaros que não pode ver, até que finalmente acabará descobrindo que não precisa do anel nem de pássaro para voar sozinho acima da quietude das nuvens.
E quando esse dia chegar, deve dar seu presente a alguém que saiba que irá usá-lo bem, alguém que possa aprender que as coisas que importam são as feitas de verdade e alegria, não as de lata e vidro.

Rae, este é o último dia especial de comemoração a cada ano que estarei com você, tendo aprendido com os nossos amigos, os pássaros.

Não posso ir ao seu encontro porque já estou com você.

Você não é pequena porque já é crescida, brincando entre suas vidas como todos fazemos, pelo prazer de viver.
Você não tem aniversário porque sempre viveu; nunca jamais haverá de morrer.
Não é a filha das pessoas a quem chama de mãe e pai, mas a companheira de aventuras delas na jornada maravilhosa para compreender as coisas que são.
Cada presente de um amigo é um desejo de felicidade.
É o caso do anel.

Voe livre e feliz além de aniversários e através do sempre.
Haveremos de nos encontrar outra vez, sempre que desejarmos, no meio da única comemoração que não pode jamais terminar.

♥ Richard Bach

5 de abr. de 2008

Tolerância.


Que tempo e quanta energia se perde preso à pequenez das coisas.Temos o triste hábito de desprezar nossos melhores sentimentos. Sim, desprezo, esse sentimento cruel que temos a capacidade de demonstrar - ah! se avaliássemos seu efeito de retorno não o desprenderíamos com tamanha intensidade ou descaso - repudiando quem nos é caro.
O amor é a maior - e única - possibilidade que temos de atingir as pessoas e tratarmos com reverência àqueles que se tornam indispensáveis à nossa vida. Poucas vezes o fazemos. Esquecemos de enxergar esse valor insubstituível. Vivemos sem intervalo e sem a visão nova de alguma velha situação.
Estamos tão empenhados em acumular mágoas e contabilizar infortúnios que deixamos que nos tomem conta e ceguem, calem ou afaste demasiadamente. Tememos sofrer e somos nossos maiores algozes.
O que se passa nesses corações ferozes, indomáveis e intolerantes?
Somos tolerantes com quem amamos, porque somos magnânimos, mas não com aqueles que encurtamos as virtudes ou aos que, de tão menores diante da soberba avaliação dos magistrais seres superiores, se tornam insignificantes.
Esquecemos, ainda que momentaneamente, tudo que possa ter sido sentido, vivido ou dito.
Deslembramos de todo o amor, de todo o gesto, de toda intenção, de toda ação e de todos os momentos únicos, numa ruína afetiva triste e dissolutiva.
Sepultamos o ato de amar. Pura e simplesmente.
Deliberadamente.
E nos pomos depois a reclamar sem compreender.
A sofrer.
Vá entender!!

♥ Denise